segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Telhado de Palha

Ela era pequenina mas vivia numa casa grande, faustosa, com sólidas fundações e revestida de pedra. Era a sua fortaleza, o seu mundo impenetrável, pensava ela... mas as fundações ruíram com a tempestade inesperada e o que ela achava que nunca mudaria, rapidamente se transformou em mero amontoado de pedras e cacos de recordações que já nem faziam sentido.
 
Ela cresceu e, novamente, construiu e ergueu a sua casa com as fundações do conhecimento e da união, de madeira sólida e envernizada... o seu refúgio. Por alguns momentos, sentiu novamente a constância e a protecção que durante tanto tempo ansiou reencontrar.
 
Mas a madeira não resistiu a mais uma investida da tempestade e rapidamente a casa transformou-se num mikado de ilusões, projectos e expectativas.
 
Sentia-se cansada de reconstruções mas não de recomeçares. Assim, despediu-se de tudo o que tinha conhecido, despojou-se de tudo o que dela tinha feito parte e aprendeu a viver a olhar para o céu e adivinhar a tempestade.
 
Nunca mais ela quis casas de pedra nem de madeira porque a vida não é imutável, e tal como a terra, move-se milímetros por dia, imperceptível, mas o suficiente para abalar qualquer suposta sólida fundação. Agora apenas quer casas de palha, que possa transportar consigo para onde quer que esteja, sem grandes fundações que não possam ser recolhidas de cada vez que se aproximar uma tempestade. A sua casa será sempre onde estiver.
 
Não quer mais nada tão sólido que não possa ser carregado e reerguido; não quer mais laços que sejam tão apertados que não possam, a qualquer momento, ser desatados.
 
Sente-se finalmente livre, sem a ilusão da protecção que quatro paredes e um futuro aparentemente previsível pareciam proporcionar. Cada vez que chove, abriga-se com o seu telhado de palha; assim que abre o sol, recolhe-o, e faz questão de sentir na pele o calor que lhe proporciona. A tempestade que possa surgir já não a assusta...

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