segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Telhado de Palha

Ela era pequenina mas vivia numa casa grande, faustosa, com sólidas fundações e revestida de pedra. Era a sua fortaleza, o seu mundo impenetrável, pensava ela... mas as fundações ruíram com a tempestade inesperada e o que ela achava que nunca mudaria, rapidamente se transformou em mero amontoado de pedras e cacos de recordações que já nem faziam sentido.
 
Ela cresceu e, novamente, construiu e ergueu a sua casa com as fundações do conhecimento e da união, de madeira sólida e envernizada... o seu refúgio. Por alguns momentos, sentiu novamente a constância e a protecção que durante tanto tempo ansiou reencontrar.
 
Mas a madeira não resistiu a mais uma investida da tempestade e rapidamente a casa transformou-se num mikado de ilusões, projectos e expectativas.
 
Sentia-se cansada de reconstruções mas não de recomeçares. Assim, despediu-se de tudo o que tinha conhecido, despojou-se de tudo o que dela tinha feito parte e aprendeu a viver a olhar para o céu e adivinhar a tempestade.
 
Nunca mais ela quis casas de pedra nem de madeira porque a vida não é imutável, e tal como a terra, move-se milímetros por dia, imperceptível, mas o suficiente para abalar qualquer suposta sólida fundação. Agora apenas quer casas de palha, que possa transportar consigo para onde quer que esteja, sem grandes fundações que não possam ser recolhidas de cada vez que se aproximar uma tempestade. A sua casa será sempre onde estiver.
 
Não quer mais nada tão sólido que não possa ser carregado e reerguido; não quer mais laços que sejam tão apertados que não possam, a qualquer momento, ser desatados.
 
Sente-se finalmente livre, sem a ilusão da protecção que quatro paredes e um futuro aparentemente previsível pareciam proporcionar. Cada vez que chove, abriga-se com o seu telhado de palha; assim que abre o sol, recolhe-o, e faz questão de sentir na pele o calor que lhe proporciona. A tempestade que possa surgir já não a assusta...

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Vai bugiar!

Caro País,
 
Vai bugiar!!!
Mas antes faz-me um favor: deixa de arranjar incidentes diplomáticos com aquele outro país irmão, como tens feito, e fecha os olhinhos áquilo que chamas transacções obscuras de cidadãos de lá oriundos e que passam por aí. É que sabes, como não quiseste os meus préstimos depois do meu esforço de um curso superior suado e pago por mim, esse outro país alimenta-me e a mais 200 mil cidadãos como eu.
Vá lá tu consegues, até porque o fizeste muito bem quanto ao BPN inúmeras vezes e ao extinto BP, em que pessoas honestas e trabalhadoras ficaram sem o dinheiro dos seus depósitos para que os gestores de meia tigela pudessem brincar aos bancos... fazes como fizeste com os milhões gastos em submarinos que, misteriosamente, desapareceram em alto mar (vá, eu sei que o oceano é muito vasto, é natural não saberem deles), fundações e institutos públicos que apoias financeiramente e que são mais que as mães deles, ou ainda melhor, com os afamados contratos Swap tão danosos para a res publica e que ninguém é tido como responsável nem daí advirão quaisquer consequências para quem os celebrou. Também nem se sabe bem quem foi, torna-se difícil atribuir o que for a quem for…
Como podes constatar, até já tens experiência nestas situações e tenho lido que agora roubas velhos pensionistas e funcionários públicos… desculpa, isso não é roubar? Então que nome dás a isso? É que não estou a ver outro, pois os gestores milionários de empresas públicas insustentáveis e geridas (mal) á custa do dinheiro que se paga por serviços de hotel 5 estrelas e tem-se uma prestação de motel de estrada nacional (daqueles com direito a garagem para esconder o carro, vá!), continuam intocáveis nos seus ordenados e pensões milionárias.
Já agora, aquela questão das licenciaturas em 24 horas (que nem on line se conseguia tão rápido) e diplomadas ao Domingo, estão sanadas? Como ficou a idoneidade e moral desses cidadãos que, por mero caso, fizeram parte do aparelho de Estado? Tens que ter cuidado com essas coisas, fica-te mal deixar passa-las e julgar a idoneidade e moral de outros.
Não ouvi bem, falaste em corrupção, branqueamento de capitais naquele outro país? Mas espera… então e aquelas empresas, cujo único cliente é o Estado que, por melhores que sejam intelectualmente as suas equipas, levam couro e cabelo pelos serviços que prestam? Aqueles tais consultores, geniais, a julgar pelos valores facturados. E contas offshore? É que ainda ninguém percebeu se os banqueiros e afins podem ter ou não… na dúvida, eles lá vão tendo!
Olha por falar nisso, será que eu, como cidadã contribuinte, posso ter acesso à factura do fio dental e vestido leopardo que um determinado maestro, que dirigiu a Casa da Música, pago por mim e pelos outros contribuintes, que habita numa casa com piscina mas que, coitadinho, vive da reforma e não pode devolver os valores que como perdulário que é, igual a tantos outros, gastou indevidamente? Era só mesmo por curiosidade…
Quando puderes, faz-me também o seguinte favor: arranja-me um “tacho” como secretária de um adjunto de assistente de ministro, a ganhar 3.000€ por mês. Oh pá, fazia cá um jeito…
Saí daí porque estava farta de ser “lixada” por ti e agora, até mesmo longe, tentas “lixar-me” na mesma, deitando por terra boas relações entre dois países que tanto custaram a (re)construir.
Acho que não estou a pedir muito e, então depois disto tudo, podes ir BUGIAR, que eu deixo!
Assinado,
Uma descontente emigrante mista (daquelas que emigraram (i) voluntariamente, (ii) porque pretendia ter uma vida decente e ser independente e, por fim, (iii) porque me mandaste).
PS – Este texto foi escrito ao abrigo (não da porcaria do AO que me impuseste e que não aceito) da liberdade de expressão que reina aí mas não no outro país (parece que é verdade…). Mas sabes, a liberdade de expressão não alimenta barrigas e é vã quando ninguém liga ao que dizemos e torna-se cronicamente surdo. Mais vale nem poder falar, porque o resultado é exactamente o mesmo e tem-se muito menos trabalho!

quarta-feira, 4 de setembro de 2013

Butterflies...

Não concordo, está dito!
Os senhores da psicologia que me perdoem a audácia mas a experiência precede a teoria a maior parte das vezes e não o contrário, como se possa pensar. Se não, estaremos perante teorias cheias de palavras e vazias de emoções que as comprovem.

Diz-se então, à boca cheia, que se deve fazer o “luto” da perda, que não funciona querer desde logo, "dar o salto" para o futuro menos doloroso... pois bem, funciona!

Quem quiser ficar preso à pior perspectiva de que o tempo nos traga o que precisamos para "dar o salto", que fique! Não espero que o tempo me traga nada que já não esteja dentro de mim, acessível, assim que me dispuser a utilizar esse recurso precioso, a qualquer momento. Recuso o luto numa perspectiva de algo a que tenho que me obrigar a fazer e que tem um tempo determinado para se prolongar, com a promessa dos melhores resultados. O luto é imediato, desde que nos recusemos a continuar algo que nada de bom nos traz e que desejemos dias com o melhor que a vida pode oferecer-nos.

Qual tempo, qual quê... desde quando o tempo confere intensidade seja ao que for? A intensidade vem do que e como sentimos e, essencialmente, queremos sentir. É nosso o poder de escolher a mudança instantânea do que povoa a alma e a domina, em qualquer momento da nossa vida.

Escolhi, essencialmente, que brote o melhor de mim... desde logo! E sinto o que e como quero, com a intensidade que me é inerente em todas as facetas da minha existência.

Não há felicidade que entre por uma porta que insista em estar fechada, nem que espere a espreitar pela janela, que o tempo passe. A chave seremos sempre nós.

And I feel butterflies... a lot of butterflies!!

domingo, 21 de abril de 2013

Esse enorme poder

Há quatro anos atrás, tomei a maior decisão da minha vida: largar tudo o que conhecia há 32 anos e abraçar o desconhecido, o vazio de representações e experiências. Um desafio, convenhamos, de monta!

Tudo parece-nos estranho, naquele início de coisas que não parecem mas depois ficamos a saber o quanto são boas. Desentranhamos toda uma vida e entranhamos outra diferente, nova, uma infinidade de possíveis.

É uma daquelas raras oportunidades de reinventar-nos, sermos quem efectivamente sempre quisemos ser mas que até aí ainda não tínhamos conseguido. Não é fácil a troca de uma vida por outra e a sensação permanente de que já não somos de lá e não sabemos quando seremos de cá ou se o seremos, um dia.

Com o decorrer do tempo, percebemos que tudo é muito ilusório e o que realmente torna-nos no que somos é o que está dentro de nós, muito mais do que onde estamos.

Sei que, mesmo quando já não estiver em Angola, na verdade, Angola estará sempre em mim. Faz parte do que sempre quis ser e não estou disposta a abdicar dessa magnitude.

Afinal, não é todos os dias que temos a possibilidade de reinventar-nos... esse é um enorme poder!

segunda-feira, 4 de março de 2013

Exmo. Tu...



Exmo. Tu,

Ás vezes as coisas acontecem sem uma razão…verdade enganosa, esta. Tudo tem uma razão para acontecer, podemos é não perceber, desde logo, qual é. Confesso-te que quanto a ti ainda não consegui descortinar, após tanto tempo.

Seria o teu eu tão mais importante que o nosso nós? Efectivamente, foi, e suplantou tudo o que tinha sido reconstruído arduamente, depois de todo o caminho percorrido.

Bastava que me olhasses nos olhos, pegasses nas mãos com convicção de quem sabe o que quer e dissesses que nós continuávamos  a existir e que o teu eu, temporariamente, esqueceu-se disso. O meu eu dir-te-ia que nada mais era tão importante e traçaria novamente os planos adiados por algum tempo, desta vez a marcador e não a lápis.

Mas o teu eu não o fez, enredou-se em desculpas e falas mansas sem nunca explicar ao nós o que o tu tinha feito. 

Dizem que o tempo cura, mas não…apenas cicatriza e às vezes, com sorte, cauteriza.

Espero que o teu eu esteja satisfeito, porque conseguiu que restasse apenas o tu e eu. Grande coisa para se conseguir…

Melhores Cumprimentos,

Nós

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2013

Conselhos


Já dizia a minha querida avó que, se os conselhos fossem mesmo bons, não se davam… vendiam-se! Não podia concordar mais com ela e foi estranho que alguém tão simples me pudesse transmitir tão magnânima verdade.

Aconselharam-me a ser ponderada, nunca dizer tudo o que se pensa pois há uma imperiosa necessidade – de quem? – de se ser politicamente correcto, socialmente. Na verdade, conhecem-me pela minha honestidade desabrida, pela frontalidade como digo, não tudo o que penso mas, de certeza, tudo aquilo que penso que devo dizer.

Aconselharam-me, igualmente, a ficar pela minha zona de conforto, o que eu conheço, o que é meu por usucapião de sentimentos, porque… é mais seguro. Segui á risca. Embarquei num avião rumo a Angola, sem conhecer vivalma, levando na mala previsões "nostradramáticas" de perigos eminentes e insegurança ao virar da esquina. Não paguei excesso de bagagem mas asseguro-vos que o peso das saudades ultrapassava os quilos permitidos. Foi tanto como me disseram, que estou por cá há uns anitos e vivo cheia de medo de virar esquinas, só ando em frente.

No meio de tudo isto, surge a clássica, então e família? Olha que os anos passam… por isso, aconselharam-me a “assentar”. Mais uma vez, foi exactamente o que fiz; passo o tempo a viajar, não devo satisfações a ninguém a não ser que queira dá-las, sou workaholic por definição e adoro o raio da minha vida, que é tudo aquilo que sempre imaginei que ia ser, desde tenra idade.

E por fim, depois de várias acusações de entrega total e suas consequências, que deveria medir melhor, estudar as pessoas e, depois então, – então o quê? – deveria entregar-me, de corpo e alma. Nunca desobedecendo, porque gosto imenso de fazer algo que outros acham o melhor para mim, entrego-me todos os dias ao meu trabalho como se fosse ser despedida amanhã; ajudo o próximo até ao limite do meu possível, apaixono-me com a intensidade do sismo mais grave na escala de Richter.

E querem que vos diga algo… estou a adorar os resultados! Por isso, desculpem-me, mas que se lixem os conselhos!