quinta-feira, 13 de outubro de 2011

A intensa monotonia

Dizem que em Angola, é tudo muito mais intenso… e é!

Os dias mais pequenos, mas atarefados em que o mais inusitado acontece; o trânsito a qualquer hora, de ponta ou de esquina; o forçoso e frequente contacto pessoal pela diversidade e quantidade de gentes com quem nos cruzamos… mas acima de tudo, o que vivemos por cá.

Aqui vive-se, como diz um colega. Vive-se tudo, o mau que pode acontecer, o bom que acontece muitas vezes, o trabalho que passa a ser a nossa segunda casa, os problemas dos outros porque todos os semelhantes tentam aproximar-se (a comunidade tuga, a chinesa, a libanesa… há tantas!).

Esta intensidade pressupõe uma fidelidade atípica…

Deve pôr-se o carro quase sempre no mesmo sítio porque já conhecemos os seguranças; devemos sempre pagar a “gasosa” ao mesmo miúdo que nos lava o carro, porque fá-lo sentir-se da nossa preferência e orgulhoso (“Tchéé, sái daí que á madrinha branca é minha, kumé?”, diz ele a quem tenta oferecer serviços alternativos); devemos sempre comprar os CD’s ao miúdo que sabe que aquela hora, naquela fila de trânsito, lá estamos (“Madrinha, novidade de música mangolé, compra só! Caro porque é originar ou cópia munto boa. Compra só ao Manucho que tem qualidade!”);a praia é sempre a mesma porque é onde encontramos a comunidade; os restaurantes quase sempre os mesmos, mas porque as alternativas ainda são poucas; as saídas para ver os amigos ao fim de semana, sempre ou naquele sítio grande com “bué” espaço ou no mais pequeno com melhor selecção e ambiente, mas com cotoveladas elevadas ao quadrado vezes o número de pessoas que alberga.

Dizia um amigo angolano que em Angola é tudo muito fiel, "vê só, temos o mesmo presidente há mais de 30 anos e os casamentos duram muito". Fitei-o espantada e questionei como podia ele dizer uma coisa dessas quando normalmente um angolano tem, no mínimo, 3 mulheres… Foi a vez dele de me lançar um olhar inquisidor e responder: “angolano, só ama e casa com uma que é a oficial a qual trata bem, cuida, alimenta, veste e calça. As “outras” são para passar o tempo e aturar o mau humor, porque quando o angolano chega à casa de família é sempre um homem contente! Por isso os casamentos duram”. Não tive coragem de refutar tal lógica.

A intensidade aqui é assim mesmo, quase sempre com as mesmas pessoas, nos mesmos sítios, durante muitos dias… é uma confortável e intensa monotonia.

2 comentários:

  1. Está explicada a felicidade angolana! Adorei!

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  2. por isso e para muitos (nao tantos quantos seria de desejar mas mais do que se imajina): "minha Luanda cuya..."
    Manu

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